A representação da infantaria no quadro do Marquês de Leganés sobre o combate de Alcaraviça (2 de Novembro de 1645)

Saídos de Estremoz, os 400 infantes do terço da Ordenança da comarca de Évora, comandados pelo sargento-mor João da Fonseca Barreto, são surpreendidos e completamente desbaratados por uma força de cavalaria inimiga com cerca de 600 efectivos. Apesar da legenda no quadro referir uma igual composição numérica (1.000 para cada lado), as fontes documentais são bem claras.

Quanto à força de infantaria portuguesa, não restam dúvidas que seriam 4 companhias da Ordenança, a 100 homens cada. O quadro, curiosamente, parece comprovar este efectivo. Mostra dois esquadrões (formações tácticas) compostos exclusivamente por piqueiros (juntando, cada esquadrão, os piqueiros de 2 companhias). Os atiradores armados de arcabuz encontram-se abrigados atrás de uma tapada ou distribuídos pelos edifícios, estando uma parte deles já representada em fuga – curiosamente, carregando as armas, o que seria pouco praticável e contraria o que era profusamente descrito nas fontes a respeito de casos semelhantes.

Segundo as fontes coevas, reportadas num artigo de Outubro de 2008, da autoria do Sr. Santos Manoel, a inépcia do sargento-mor ao dispor as forças teria sido a causa de uma derrota que, ainda que menor no contexto dos inúmeros combates semelhantes ao longo da guerra, chocou os portugueses pela dimensão da derrocada: um terço inteiro destroçado, morta a quase totalidade dos seus soldados. Os erros que o Conde da Ericeira aponta a João da Fonseca Barreto (não ocupar e guarnecer uma tapada de parapeito alto, ou de ter dado ordem de ataque ou receber a carga de cavalaria em campo aberto) são, no entanto, contrariados em parte pela representação da força portuguesa no quadro do Marquês de Leganés.

Aí é visível que os atiradores portugueses se encontram abrigados atrás de muros – o que pode, no entanto, ser uma liberdade artística, para valorizar mais a vitória espanhola. No entanto, os esquadrões de piqueiros estão totalmente desguarnecidos de atiradores e posicionados em campo aberto. Dada a falta de preparação militar e consequente coesão, isso seria um factor facilitador da derrocada.

Um pormenor interessante é a representação de 4 bandeiras, uma por cada companhia: duas carregadas pelos respectivos alferes em fuga, outras duas em cada esquadrão de piqueiros. Aparentam ter representada uma cruz aspada – semelhante à Cruz de Borgonha dos exércitos espanhóis. No entanto, enquanto duas são verdes (verde e branco foram as cores heráldicas da casa de Bragança até 1707), uma terceira parece ter a cruz em vermelho, tal como a Cruz de Borgonha aparecia representada nas bandeiras das unidades espanholas. Uma outra bandeira, carregada em fuga, mais ao longe, é branca, mas não se distingue nela qualquer símbolo.

Outro pormenor que desperta curiosidade é a representação de 3 cavalos entre as forças portuguesas: um montado, outro que acabou de derrubar o próprio cavaleiro, e outro, mais ao longe, desmontado e em fuga. A representação dos cavaleiros com faixas brancas atadas à cintura identifica-os como portugueses. O facto, no entanto, é que apenas o sargento-mor teria direito a cavalo para se fazer transportar, o que pode significar que estamos perante outra hipóteses de liberdade artística.