A criação de cavalos para a guerra era onerosa, estando a ela obrigados os que possuíssem bens (estipulados por lei) suficientes para suportar tal encargo. Daqui resultava que fossem formadas voluntariamente algumas unidades de cavalos da milícia da ordenança. Uma vez que os cavalos deviam servir na guerra, por que não com os seus proprietários montados, ou pelo menos com alguém de sua confiança? A sua principal função era a protecção contra as incursões inimigas, mas ocasionalmente podiam retaliar, indo pilhar ao outro lado da raia. A ligação destas unidades à população residente estendia-se aos oficiais que as comandavam, com frequência membros da pequena nobreza local ou bem aceites pelas governanças e, de uma maneira geral (ou assim as fontes pretendem fazer acreditar), pelos povos.
Uma carta do governador da comarca de Évora, D. António Álvares da Cunha, dirigida ao Conselho de Guerra em 1650, demonstra a importância dessa aquiescência dos povos em relação aos oficiais comandantes, quando estes não provinham da localidade ou localidades que deviam fornecer as montadas e sustentar a unidade militar. Na referida carta, salientava o governador da comarca que António Ferreira da Câmara, fidalgo da Casa de Sua Majestade, o qual recebera patente de capitão de uma das companhias cavalos que estavam para se formar na cidade de Évora, era o fidalgo mais bem quisto do povo e o de mais experiência e valor, pois fora capitão de infantaria durante nove anos de guerra (desde o início do conflito, portanto). E que por isso deveria governar a cavalaria da ordenança daquela comarca, assim por sua qualidade, como pelos seus serviços. Reforçando esta sugestão, salientava também que o capitão tinha gasto a maior parte da sua fazenda ao serviço de Sua Majestade, e que a outra parte está “infestada pelo inimigo” – ou seja, parte das terras que possuía se encontravam ocupadas pelos espanhóis.
A resposta do Conselho de Guerra foi favorável à nomeação daquele oficial, mas com algumas condições; assim, conforme se pode ler, o dito capitão governará, pela antiguidade, a cavalaria da ordenança da comarca de Évora, desde que não se incorpore esta com cavalaria paga, e que enquanto durar tal ocasião vença o soldo que toca ao capitão de cavalos, conforme às ordens de Vossa Majestade, como vencem os capitães de infantaria de auxiliares, que é conforme à resolução que Vossa Majestade tem tomado.
Fonte: ANTT, CG, Consultas, 1650, mç. 10, consulta de 27 de Agosto de 1650.
Imagem: Cena de guerra – cavalaria procedendo a pilhagens e conduzindo prisioneiros (ou fazendo recrutamento forçado). Óleo sobre tela, Philips Wouverman, 1650.