Quase no final da Guerra da Restauração, na fronteira da província de Trás-os-Montes, uma sucessão de acções de guerra ofensiva por parte do exército português levou o receio aos moradores de muitas localidades da Galiza. Em consequência, os moradores de mais de 100 dessas localidades renderam-se a Portugal – ou, mais correctamente, foram coagidos a submeter-se às exigências do exército de Trás-os-Montes, permanecendo nas suas casas e terras, mas entregando uma parte de bens e haveres aos portugueses. Uma forma de estabelecer o modus vivendi em zonas de conflito muito comum, por exemplo, durante a Guerra dos 30 Anos.
A primeira incursão foi conduzida pelo sargento-mor de batalha Francisco de Távora, irmão do governador das armas de Trás-os-Montes, D. Luís Álvares de Távora, Conde de São João da Pesqueira (futuro 1.º Marquês de Távora, título que receberia em 1669). Estando o governador das armas ausente da província, mas com ordem dada para que o seu irmão avançasse com a operação, entrou Francisco de Távora 11 léguas Galiza adentro (cerca de 60 Km) até ao Vale de Lobeira, com 400 cavalos às ordens do tenente-general D. Miguel da Silveira e 500 infantes comandados pelo sargento-mor Luís de Barros Gavião. Por serem as povoações daquele vale riquíssimas (a expressão é do próprio sargento-mor de batalha, em carta enviada ao Conselho de Guerra), se trouxe dali presa e saque considerável. Seguiu-se uma segunda incursão, comandada pelo mestre de campo Duarte Ferreira Chaves, e uma terceira, a cargo do comissário geral da cavalaria João de Almada de Melo, ambas com bom sucesso.
Na carta enviada ao Conselho de Guerra por Francisco de Távora são descritos os motivos e os pormenores da incursão, bem como a listagem das localidades que se submeteram a Portugal.
Entendendo o Conde meu Irmão, Governador das Armas desta Província, que destruindo o país de Galiza não só segurava estas raias, mas sustentando as nossas tropas impossibilitava também aos inimigos, porque do dano que experimentavam aqueles moradores resultava à sua cavalaria a perda dos quartéis a falta dos mantimentos, procurou e conseguiu todo este ano que assim se executasse. E vendo os Galegos que se achavam forçados, ou a largar a pátria ou a viver debaixo de nosso consentimento, quiseram e escolheram comprar a assistência de suas casas a troco de seus cabedais, e assim se reduziram todos os lugares que contém o papel que envio a Vossa Majestade, a pagar uma contribuição (que se agora não é tamanha), tendo por certo que assim que se contarem os anos crescerá a quantia. Seguindo pois, Senhor, a máxima do Conde por lograr o mesmo fim, me resolvi sábado, que foram 10 do mês (tendo estas armas a meu cargo) a entrar (com quatrocentos cavalos mandados pelo tenente-general Dom Miguel da Silveira, e quinhentos mosqueteiros que governava o sargento-mor Luís de Barros Gavião) no Vale de Lobeira, onze léguas pelo interior, composto de dezanove riquíssimas e grandes povoações, aonde nunca haviam chegado os nossos soldados, e de que tiraram boa presa e grande saco. O mestre de campo Duarte Teixeira Chaves e o comissário geral João de Almada de Melo, a quem por diversas partes mandei fazer segunda e terceira invasão, tiveram a mesma felicidade, obrando-se tudo sem a menor resistência, como sucederá sempre que com o nome de Vossa Majestade intentemos outras empresas.
Guarde Deus a muito alta e poderosa Pessoa de Vossa Majestade […].
Chaves, 13 de Dezembro de 1667.
Segue-se uma extensa lista com os nomes das 112 localidades, alguns dos quais de difícil percepção devido à caligrafia:
Feris de Lima
Vila Maior de Gironda
São Milhão
Medeiros
São Cristóvão
Santa Vaia
Mandim
Valtar
Ninho d’Águia
Vila Maior da Boa Hora
São Paio da Badis
São Lourenço de Tozende
Sanenago
Rubias
São João
Mendim
Santiago de Baixo
Requiones
Vilar d’Alhos
Pedroza
Bouço
Graveliz
Lijões
Gumanriz
Eixames
Godem
Tamagelos
Tamangos
Alourazes
Mar
Tourem
Olmbra
Rozal
Bouzeins
Moinhos
Salcharens
Nogueira
Prado
Gomar
São Fernando
Prado Novo
Huetras
Larosa
Pijeires
Pijeiros
Pereiro
Sabuzedo
Parada
Covelos
Moreiros
Vilar de Lebres
Moimenta
Lobos
Tresmores
Coaledo
Vilaça
Ataes
Pivadaz
Nuzelos
Vilar de Servos
Herreros
a Madonelha
Sendim
São Martinho
Lubença
Asezedo
Carçosa
Vila de Rey
Soutelo
Santo António
Santo Antoninho
Alvaredos
Ababidis
Pinheira
Infesta
Santa Valha da Lima
Chamuzinhos
Pardieiros
Lovanzes
Soutelo da Limia
São Pedro da Limia
Rebordachã
Somis
Satharis
Lodozelo
Freixo
Pambre
Suzedo da Pena
Escarnabois
Coais
Souto Chão
Cherrande
Arsolá
Crastelo de Baixo
São Vicente
Dona Elvira
Vergunda
Riós
Vilarinho da Toussa
A Barreira
Vilar de Flor
Tameirão
Crastelos de Moterrey
Passos
Gueiçães
Covas
Fiães
Arsadagues
Salharinz
São Salvador
Barria
Covis
Fonte: ANTT, Conselho de Guerra, Consultas, 1668, mç. 28, consulta de 11 de Janeiro de 1668.
Imagens: Castelo de Chaves, na actualidade; e retrato do governador das armas de Trás-os-Montes em 1667, o Conde de São João da Pesqueira, D. Luís Álvares de Távora.